31ª Câmara de Direito
Privado
COMARCA : SÃO PAULO
APELANTE : CVGM
APELADA : PORTO
SEGURO COMPANHIA DE SEGUROS GERAIS
Juiz 1ª Inst. : Carlos Henrique Abrão
SEGURO DE VEÍCULO.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. NEGATIVA DE PAGAMENTO EMBRIAGUEZ
DO CONDUTOR EVIDENCIADA PELO CONJUNTO PROBATÓRIO, SUFICIENTE PRONTUÁRIO DE
ATENDIMENTO ELABORADO PELO PRONTO-SOCORRO DO HOSPITAL DAS CLÍNICAS, PARA ONDE
FOI LEVADO O APELANTE APÓS O ACIDENTE -PRESCINDIBILIDADE DO EXAME DE DOSAGEM
ALCOÓLICA - AGRAVAMENTO DO RISCO. CARACTERIZAÇÃO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA SENTENÇA
MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO.
Trata-se de apelação interposta contra
r. sentença de
fls. 202/205, cujo relatório adoto,
que julgou improcedente ação
de indenização por danos materiais e
morais, fundada em
contrato de seguro de veículo,
condenado o autor no pagamento
das custas, despesas processuais e
honorários advocatícios, estes
fixados em 10% sobre o valor da causa,
determinada retirada do
salvado do pátio da seguradora no
prazo de 15 dias, sob pena de multa.
Recorre o vencido. Sustenta, em
síntese, que as
provas dos autos são inconclusivas
quanto à embriaguez do
condutor, insuficiente simples exame
clínico para se alcançar tal
conclusão. Assevera que não há provas
quanto à alteração do
estado mental, havendo, mais,
necessidade de comprovar que o
agravamento do risco foi causa
determinante do acidente. Aduz
que cláusulas restritivas de direitos
devem ser redigidas com
destaque, insistindo, portanto, na
condenação da apelada.
Recurso processado, sem resposta.
É o breve relatório.
A inconformidade não prospera, de
rigor a
manutenção do resultado obtido na r.
sentença por seus próprios
fundamentos, nos termos do art. 252 do
RITJ/SP, ora ratificados
e adotados como razão de decidir.
Depreende-se da inicial que, em 27 de
maio de 2007,
por volta das 21:00 horas, o veículo
Fiat Brava, placas GZP-
7235, conduzido pelo autor, segurado
pela ré, adentrou
contramão de direção, na Avenida
Brigadeiro Luís Antônio, altura
do número 3.652, nesta Capital,
colidindo frontalmente com
ônibus que transitava na faixa
exclusiva, causando danos, à
integridade dos ocupantes de ambos os
veículos.
Sobreveio negativa da seguradora,
calcada na
embriaguez do segurado, ora apelante
(fls. 18/19).
Pois bem.
Sem maiores delongas, o decisum analisou
corretamente as questões postas em
julgamento mediante
criteriosa avaliação de elementos
probatórios, conferindo à causa
a mais adequada e justa solução, razão
pela qual resiste
claramente às críticas que lhe são
dirigidas nas razões recursais.
Qualquer acréscimo que se fizesse aos
seus sólidos fundamentos
constituiria desnecessária
redundância.
A propósito, o Novo Regimento Interno
do Tribunal
de Justiça do Estado de São Paulo
estabelece que, "nos recursos
em geral, o relator
poderá limitar-se a ratificar os fundamentos
da decisão recorrida,
quando, suficientemente fundamentada,
houver de
mantê-la".
Ademais, predomina na jurisprudência
do Superior
Tribunal de Justiça reconhecimento da
viabilidade do órgão
julgador adotar ou ratificar o juízo
de valor firmado na sentença,
inclusive transcrevendo-a no acórdão,
sem que tal medida
encerre omissão ou ausência de
fundamentação no decisum
(REsp n° 662.272-RS, Segunda Turma,
Rel. Min. JOÃO OTÁVIO
DE NORONHA, j. 04.09.2007; REsp nº
641.963-ES, Segunda
Turma, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJ de
21.11.2005; REsp nº
592.092-AL, Segunda Turma, Rel. Min.
ELIANA CALMON, DJ de
17.12.2004; REsp nº 265.534-DF, Quarta
Turma, Rel. Min.
FERNANDO GONÇALVES, DJ de 1.12.2003).
Nesse sentido, os concisos e objetivos
fundamentos
da r. sentença apontam:
“Neste diapasão,
insta ponderar que o condutor do
veículo segurado, o
próprio autor, estava na contramão de
direção, quando
invadiu a faixa exclusiva do coletivo, colidindo
frontalmente, mais
não seria preciso dizer, exceto o parecer
técnico do órgão
reportado, cujo substrato, por si só, subsidia a
análise do caso
concreto.
Consequentemente, os
dados encaminhados
destacam que o exame
físico realizado no paciente externou
sinais clínicos de
intoxicação alcoólica, hálito etílico e fala ébria
(fls. 190).
Descabe a ponderação
do autor quando pretende a
imprescindibilidade
da realização do exame, a fim de configurar
formalmente seu
estado de embriaguez, isto porque não é crível,
se estivesse sóbrio,
pudesse colidir na faixa exclusiva do
coletivo, com perda
total, comprometendo a própria integridade
física, esquecendo-se
da literalidade do contrato, requisito da
boa-fé, porquanto
agravou o risco inocuamente, não podendo a
seguradora responder
pela sua incúria.
Recentemente, em caso
análogo, o STJ retirou a
possibilidade do
condutor receber seguro de vida, quando
constatada sua
embriaguez, levando em consideração o risco
agravado e o
descumprimento dos termos do contrato,
porquanto aquele que
ingere bebida alcoólica assume a
responsabilidade e as
consequências de suas atitudes advindas.
No caso concreto,
pois, não cabe qualquer
indenização, levando
em conta o sítio do acidente, invadiu a
faixa exclusiva de
ônibus, estado de embriaguez corroborado
pela documentação
apresentada, afora isso, colhe destacar que o
princípio 'pacta sunt
servanda' sofre inevitável infirmação,
quando afetado pela
conduta culposa do segurado, cujo
comportamento traduz,
no mínimo, irregularidade, além de
infração de trânsito
configurada”.
Portanto, conforme já mencionado, a
prova dos autos
indica que o apelante estava
trafegando pela contramão de
direção, em via pública de grande
circulação de veículos e faixa
exclusiva de ônibus, e sob a
influência de álcool, dando causa ao
grave acidente.
Ora, esse quadro revela que o segurado
intencionalmente agravou o risco
cessando a cobertura por força
do art. 768 do Código Civil, verbis:
“Art. 768. O segurado
perderá o direito à garantia se
agravar
intencionalmente o risco objeto do contrato”.
O segurado, portanto, deve abster-se
de tudo que
possa aumentar os riscos, sob pena de
perda do direito à
indenização.
Ora, sabe-se que o álcool ocasiona
instabilidade
emocional, diminuição da inibição,
perda do julgamento crítico,
enfraquecimento da memória e da
compreensão, decréscimo de
resposta sensitiva, falta de
coordenação muscular.
É sabido, até mesmo em razão da Lei
Seca, que o
álcool afeta os reflexos psicomotores
da pessoa, influenciando na
capacidade de percepção de tempo,
distâncias e velocidades,
bem como na capacidade de reação. É
certo que o álcool pode
afetar o comportamento de forma diversa
de pessoa para
pessoa, porém, infere-se que, mesmo
consideradas tais
variações, sem qualquer elemento de
prova a demonstrar o
contrário, a concentração de álcool
encontrada no sangue do
motorista já seria hábil para, em
tese, aumentar o risco de
envolvimento num acidente.
Aliás, a esse respeito, a situação
fática e o conjunto
probatório tornam prescindível o exame
de dosagem alcoólica.
Nesse sentido:
“CÓDIGO DE TRÂNSITO -
Embriaguez - Materialidade
e autoria
suficientemente comprovadas - Ausência de exame de
dosagem alcoólica -
Irrelevância - Estado etílico que pode ser
comprovado por provas
testemunhais e atestado clínico,
prescindindo desse
exame Depoimentos dos policiais coerentes e
harmônicos - Penas e
regime carcerário corretamente fixados.
Improvimento" (Apelação nº
9145620-51.2004.8.26.0000, Rel.
Ericson Maranho, 02/12/2005).
Em suma, incumbia ao apelante o ônus
de provar
que a ingestão de álcool apurada pelo
Hospital das Clínicas (fls.
124, 188 e 190) não aumentou ou
agravou o risco a ocasionar a
perda do seguro. Aliás, nesse ponto,
não há que se falar em
inversão do ônus da prova. Não há como
se exigir que a ré
provasse que houve o agravamento do
risco. E a prova
produzida não se verifica suficiente a
essa demonstração.
Quanto ao mais, considerado o exame
clínico,
havendo expressa referência à exclusão
de responsabilidade da
seguradora quanto aos eventos
ocorridos em consequência de
atos ilícitos dolosos praticados pelo
segurado, expressamente
excluídos, além destes, acidentes
ocorridos em consequência de
quaisquer alterações mentais direta ou
indiretamente
consequentes do uso de álcool, de
drogas, de entorpecentes ou
de substâncias tóxicas, justa a recusa
ao pagamento.
Não se pode olvidar que inúmeras as
hipóteses em
que possível cogitar que condutor
alcoolizado possa ser vítima de
acidente automobilístico, sem que tal
tenha sido sua causa
determinante. É preciso que a ingestão
de bebida alcoólica
influencie direta ou indiretamente no
acidente.
Ocorre que, diante do conjunto
probatório, inegável a
conclusão de que houve relação entre o
estado de embriaguez
do segurado e o sinistro, bastando
atentar para as circunstâncias
e a forma como ocorreu a colisão. A
embriaguez irresponsável e
infeliz do motorista é suficiente para
o desgoverno do
conduzido de modo a provocar grave
acidente.
Ademais, o fato de a Lei nº 8.078/90
estabelecer que
o contrato deve ser interpretado em
favor do consumidor, não
importa em aceitação total e
irrestrita de tudo que for por ele
alegado, nem afasta o princípio da
ampla defesa e do
contraditório.
O segurado parece ter ignorado a
máxima: “Se beber
não dirija, se dirigir não beba”.
Ante o exposto, nego provimento ao
recurso.
FRANCISCO
CASCONI
Relator
Fonte: TJSP
Maria da Glória Perez Delgado Sanches
Membro Correspondente da ACLAC – Academia Cabista de Letras, Artes e Ciências de Arraial do Cabo, RJ.
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